terça-feira, 26 de outubro de 2010

A verdadeira MACABÉA - Béa BÉa (não é Béia)

Macabéa, Béa, béa, sou eu. Mas pode ser você. Há outras, não me importo - sejam! Se quiserem o meu nome, sobrenome, a minha roupa, os meus desastres, minha pompa e circunstância, meu avessos, minhas letras, tudo se los doy!

Nada mais importa diante de um nome que não tem pai, parentes, amantes ou dinheiro...de que serve? Aflito, o espelho não responde nem dá tréguas ao tempo como fez com Dorian Gray. Levem-me aos mares, aos desertos, bebam água, matem a ssede, tirem de mim a alma, mas o corpo não me levem.

Deixem-me aqui para que os ratos roam, os insetos comam, os homens se deleitem.
Deixem o que me resta que chama-se dignidade. Em meio às feras no zoológico humano, Macabéa, Béa, béa, soy Yo! Pero declino. Usem e abusem do poder de Macabéa essa moça que já foi mocinha, cinco vezes anistiada, tantas vezes foi amada, sem perdão.


....



Macabéa não confessa bajo tortura sino que toca piano a quatro mãos. É a vida, Macabéa, Béa béa. Essa sou eu. Mas pode ser você, fique à vontade.


Não importa, Dorian é cinza, Macabéa é preta. De fuligem humana. Coberta. A mínima réstea de luz comporta a sua escrivaninha. Escreve compulsivamente e não tem tempo para o pensamento. Macabéa é meio alfita, meio urgente e histérica. Há nela traços de esquizofrenia aguda, disfarçada pelos trapos que carrega, como um casquinhho preto debaixo do braço. Não é difícil reconhecê-la nas ruas porque está sempre gritando aos transeuentes alguma loucura qualquer que lhe vem à mente. Mente? Não, não há mente. So um vazio estereotipado (que é isso?)?


Sou eu, mas pode ser você.



Dorian Grey, ou Doryan Grei, ou Dorian Gray (Joyce?). Sei lá. Macabéa é uma ex-artista. Leu muito durante a vida agora esquceu. Dizem que é Alzheimer, não se sabe. O fato é que Macabéa ainda vive. Pós ditadura, pós-guerra, pós-infarto, pós isso e aquilo outro. Muitos pós.


Macabéa arrumou as malas, as maletas, malotas e malinhas, a frasqueira, a caixinha de primeiros socorros, a de costura, a de bijuterias, um grande saco plástico contendo coisas, o casaquinho preto debaixo do suvaco depilado. Hoje ela está atroz, agitada.

Sempre, partir é dolorido. Deixa-se (ela) um pedacinho aqui, outro acolá, o medo de perder-se total soprando inconveniências do tipo "se aquieta, mulher!". Mas ela não quer, não quer deixar de estar indo, dentro dela essa angústia move montanhas e sertões.

O lugar é lindo. A kiti (está escrito assim no anúncio: aluga-se kiti. Ficou sabendo que ali era o the place. Home sweet home. Tem até jardim de inverno (tsc...ela pensou que era um quintalzinho...e o porteiro informou que lá em cima, na cobertura, ela pode tomar banho de sol e estender roupas grandes para secar - na "laje"?.

Não deixou transparecer o espanto. Achou tudo tão chic... Emocionamente aconchegante: aquelas janelas enormes, antigonas, lindas lindas, o chão de linóleo, tábua corrida, o banheiro, oh my God, é enorme. Quem sabe finalmente, a tão sonhada banheira...

Desta vez a partida é feliz, cheia de esperança. O amigo disse-lhe ao telefone: - seja feliz, você merece. Não, Macabéa não merece, ela apenas precisa urgentemente.



......


A última de Macabéa foi exagerar um pouco no apraz e sair pela Consolação, atravessando bonequinhos vermelhos, sem esperar ficarem verdes, parando no meio da rua atrapalhando o trânsito de pedestres, e, como um zumbi, entrava e saía em qualquer loja, separava um monte de coisa e quando chegava ao caixa para pagar, desistia. Na Loja Marisa separou quatro soutiens de renda (preta, vermelha, outra preta e uma branca), dezenove cacinhas de rendas super sexys, depois de passar quase duas horas provando os ditos cujos (soutiens, né, porque calcinha não se experimenta). Um levantava demais, o outro achatava demais, outro apertava muito, enfim...Pensou "para que quero isso - tenho uns quatro lá em casa,,,"

Decidiu que, um dia, quando vendesse seus livros e seus quadros mandaria colocar silicone nas partes interessantes, essas que os homens gostam: peito e bunda. Morreria gostosa.

Depois entrou num shoping e aquele tipo de iluminação especificamente preparada para deixar as pessoas enlouquecidas numa espécie de sindrome de compra, deixou-a imediatamente entorpecida e perdeu a noção do gosto e poder. Tudo que está ali parecia absolutamente essencial à sobrevivência da pobre: quase comprou um cachorro de louça (um galgo), seguindo o conselho de sua sobrinha "tia compra um cachorro para lhe fazer companhia"! E uma tal de uma panela elétrica que fazia até receita do Mr. Klotz. Por sorte não tinha levado o cartão de crédito, sim, por felicidade. . E estava com uma bota apertada, tanto que quando chegou em casa as unhas dos dedos pés estavam roxas - sério!

Macabéa entrou no cinema escuro e começou a assistir "O pequeno Nicolau". Todos riam desbragadamente, ela sorriu um pouco discretamente, apesar de gostar do surrealismo das histórias baseadas em fatos reais. Os meninozinhos eram quase todos muito feinhos e magrinhos. Mas não era esse o problema.

Ontem era o dia 7 de julho de 2010, isso implica uma tristeza terrivel e um segredo de Macabéa.

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